domingo, 27 de abril de 2014

‘Marco civil’ da internet brasileira estabelece a censura, restringe a liberdade de expressão, cria instrumentos de vigilância e invasão da privacidade e destrói a neutralidade da rede

Por Sergio Ulhoa Dani, de Bremen, em 27 de abril de 2014

Com o ‘marco civil da internet’, o Brasil junta-se ao seleto grupo de países como China e Irã, empenhado no controle da internet. O texto do ‘marco civil’ aprovado pelos deputados no Congresso de Brasília em 25 de março de 2014 (curiosamente meio século depois do último golpe da ditadura militar) promete censura, invasão da privacidade e ameaça à neutralidade da internet no Brasil.

O artigo 9º garante ao presidente da república a ‘atribuição privativa’ de decidir sobre a ‘discriminação ou degradação do tráfego’ da internet, especialmente em casos de certas ‘exceções técnicas’ ou ‘emergenciais’. A delegação de responsabilidade privativa ao presidente da república constitui um retrocesso e sinal da fraqueza e estultícia da democracia brasileira.

Mais adiante, o ‘marco civil’ obriga os provedores a armazenar os dados pessoais dos usuários, como os registros de conexão. 

O Artigo 19, ‘com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura’ obriga o provedor de aplicações de internet a ‘tornar indisponível’ o conteúdo de terceiros apontado como ‘infringente’ por ‘ordem judicial específica’, sob pena de o provedor ser ‘responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros’. 

O parágrafo 3º desse mesmo artigo reza: ‘As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade bem como sobre a indisponibilidade desses conteúdos por provedores de aplicações de internet poderão ser apresentadas perante os juizados especiais’.

Esse artigo garante que um magistrado qualquer de um juizado especial, sem a necessidade de ouvir advogado, poderá conceder tutela antecipada com efeito imediato de censurar conteúdo de internet.

É surpreendente que um texto tão mal-escrito, inconstitucional e danoso à liberdade de expressão, à privacidade das pessoas e à neutralidade da rede tenha sido aprovado pelos deputados que deveriam representar os interesses do povo.

Quem ganha e quem perde, quando o balanço entre a vida real e a virtual não fecha?


Por Sergio U. Dani, de Bremen, 26/04/2014


À medida que a crise ambiental, social, econômica e financeira mundial alastra e se acentua, cresce o mal-estar, a insegurança e o sofrimento das pessoas. Ao mesmo tempo, cresce também um movimento global de resistência. 

Os cientistas foram os primeiros a alertar sobre o esgotamento da capacidade de suporte da vida num planeta de recursos limitados sob intensa pressão antrópica. Mais tarde políticos, economistas e juristas aderiram ao debate. As discussões travadas a partir do início da década de 1980 sob os auspícios das Nações Unidas culminaram com a publicação do Relatório Brundtland, em 1987 [1]. Esse documento trouxe a proposta do ‘desenvolvimento sustentável’, uma forma de desenvolvimento econômico e social capaz de ‘atender às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas necessidades’.

Passadas quase 3 décadas da publicação do Relatório Brundtland, o modelo do desenvolvimento sustentável não se estabeleceu, nem mesmo nas comunidades em convívio direto com a natureza. A forte pressão sistêmica global para ganhos de capital via exploração de matérias-primas e trabalho, produção e consumo de bens e serviços dificulta a aplicação do modelo. Essa pressão é exercida sobre as reservas dos recursos sócio-ambientais, acabando por anexá-las à crise sistêmica, em vez de emancipá-las da crise. Se está claro que as contas reais desse processo não fecham, então por que e como a ciranda do sistema continua? 

Para pessoas como Margrit Kennedy [2], Andreas Popp [3] e Karen Hudes [4], a resposta é a corrupção do sistema financeiro e monetário mundial que beneficia um número limitado de pessoas e corporações posicionadas no topo da hierarquia sócio-econômica.

Nosso sistema monetário trabalha como uma bomba que suga capital da região em que ele é ganho, e o leva para onde se alcançam os maiores rendimentos. Quando o habitante de uma região leva seu dinheiro ao banco, ele espera que o banco invista o seu dinheiro onde o maior ganho seja alcançado.’[2]

Nas instituições financeiras, o salário ganho imediatamente transforma-se em capital e foge do controle de quem o ganhou. As especulações, as fraudes e a manipulação das taxas de juros e da cotação do ouro e outras commodities constituem mecanismos, enquanto a própria instituição dos juros constitui a causa do problema. Em tudo que adquirimos há juros compulsoriamente embutidos. A especulação financeira no sistema monetário vigente constitui um mecanismo alocativo concentrador de renda virtual e poder real que ameaça a estabilidade do próprio sistema. 

Os grandes especuladores e arrecadadores são as corporações transnacionais que se apoderaram do controle do mercado global [5], influenciando o pensamento e a ação dos governos e a vida das pessoas, propagando suas ‘verdades’, provocando crises ambientais, sociais, econômicas e financeiras e até incitando as guerras que lhes convém. Esse limitado número de pessoas e corporações vive distante das bases de produção dos ecossistemas. Paradoxalmente, essas pessoas e corporações detêm o poder de decisão sobre o que acontece nas bases: a vida real nas bases de produção dos ecossistemas está artificialmente atrelada à vida virtual nos sub-sistemas corporativos e financeiros. Essa vinculação artificial é mantida à custa de expedientes essencialmente corruptos e violentos, incluindo a especulação, a agiotagem, a propaganda e outras formas de dominação. Num mundo cada vez mais urbanizado, a corrupção e a prepotência do capital resultam na eficiente escravização e endividamento de bilhões de pessoas e destruição das bases de produção dos ecossistemas.

O movimento de resistência a esse status quo tem usado a internet como arma para enfrentar o controle e a manipulação, organizar demonstrações e protestos. A ‘Primavera Árabe’, os protestos contra a corrupção que levaram milhões de pessoas às ruas no Brasil em 2013, e as vigílias pela paz e autodeterminação dos povos que movimentam milhares de pessoas em várias cidades alemãs nas últimas semanas são demonstrações do descontentamento sistêmico da população. 

Aos poucos, o movimento de resistência vai produzindo soluções, como a regionalização, em complementação à globalização: Pois a região é uma unidade política de uma ordem de grandeza que torna possível às pessoas assumir de novo suas responsabilidades (...). Se nós quisermos evitar que o desemprego continue a aumentar, a negligência e o abandono social e o vandalismo alastrem, a classe média seja degradada e as pessoas bem instruídas emigrem, como hoje já está acontecendo em várias regiões da Europa e do mundo, a moeda regional é exatamente o instrumento certo, a fim de re-regionalizar os ciclos do dinheiro e da economia, e desta forma interromper a queda do poder de compra’ [2].

Referências e notas:

[1] Relatório Brundtland é como é conhecido o documento intitulado ‘Nosso Futuro Comum’ (‘Our Common Future’), publicado em 1987. O Relatório, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, chefiada pela médica, diplomata e política, a primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, faz parte de uma série de iniciativas, anteriores à Agenda 21, as quais reafirmam uma visão crítica do modelo de desenvolvimento adotado pelos países industrializados e reproduzido pelas nações em desenvolvimento, e que ressaltam os riscos do uso excessivo dos recursos naturais sem considerar a capacidade de suporte dos ecossistemas. O relatório aponta para a incompatibilidade entre desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo vigentes. Fonte: Wikipedia.

[2] Kennedy, M. 2012. Occupy Money. J. Kamphausen Verlag & Distribution GmbH, Bielefeld. ISBN 978-3-89901-595-9

[3] Andreas Popp cunhou um termo para o sistema monetário e financeiro defeituoso e doente baseado na concentração de riqueza e poder proporcionado pelos juros, uma espécie de governo da agiotagem: Danistacracia (do latin Danista, agiota, e -cracia do grego). http://www.wissensmanufaktur.net/danistakratie

[4]   “Karen Hudes is a graduate of Yale Law School and she worked in the legal department of the World Bank for more than 20 years.  In fact, when she was fired for blowing the whistle on corruption inside the World Bank, she held the position of Senior Counsel.  She was in a unique position to see exactly how the global elite rule the world, and the information that she is now revealing to the public is absolutely stunning.  According to Hudes, the elite use a very tight core of financial institutions and mega-corporations to dominate the planet. The goal is control.  They want all of us enslaved to debt, they want all of our governments enslaved to debt, and they want all of our politicians addicted to the huge financial contributions that they funnel into their campaigns. Since the elite also own all of the big media companies, the mainstream media never lets us in on the secret that there is something fundamentally wrong with the way that our system works. Remember, this is not some ‘conspiracy theorist’ that is saying these things.  This is a Yale-educated attorney that worked inside the World Bank for more than two decades.  The following summary of her credentials comes directly from her website: ‘Karen Hudes studied law at Yale Law School and economics at the University of Amsterdam. She worked in the US Export Import Bank of the US from 1980-1985 and in the Legal Department of the World Bank from 1986-2007. She established the Non Governmental Organization Committee of the International Law Section of the American Bar Association and the Committee on Multilateralism and the Accountability of International Organizations of the American Branch of the International Law Association. Today, Hudes is trying very hard to expose the corrupt financial system that the global elite are using to control the wealth of the world. During an interview with the New American, she discussed how we are willingly allowing this group of elitists to totally dominate the resources of the planet. ‘A former insider at the World Bank, ex-Senior Counsel Karen Hudes, says the global financial system is dominated by a small group of corrupt, power-hungry figures centered around the privately owned U.S. Federal Reserve. The network has seized control of the media to cover up its crimes, too, she explained. In an interview with The New American, Hudes said that when she tried to blow the whistle on multiple problems at the World Bank, she was fired for her efforts. Now, along with a network of fellow whistleblowers, Hudes is determined to expose and end the corruption. And she is confident of success. Citing an explosive 2011 Swiss study published in the PLOS ONE journal on the ‘network of global corporate control,’ Hudes pointed out that a small group of entities — mostly financial institutions and especially central banks — exert a massive amount of influence over the international economy from behind the scenes. ‘What is really going on is that the world’s resources are being dominated by this group,’ she explained, adding that the ‘corrupt power grabbers’ have managed to dominate the media as well. ‘They’re being allowed to do it.’ Previously, I have written about the Swiss study that Hudes mentioned.  It was conducted by a team of researchers at the Swiss Federal Institute of Technology in Zurich, Switzerland. They studied the relationships between 37 million companies and investors worldwide, and what they discovered is that there is a ‘super-entity’ of just 147 very tightly knit mega-corporations that controls 40 percent of the entire global economy. ‘When the team further untangled the web of ownership, it found much of it tracked back to a ‘super-entity’ of 147 even more tightly knit companies – all of their ownership was held by other members of the super-entity – that controlled 40 per cent of the total wealth in the network. ‘In effect, less than 1 per cent of the companies were able to control 40 per cent of the entire network,’ says Glattfelder. Most were financial institutions. The top 20 included Barclays Bank, JPMorgan Chase & Co, and The Goldman Sachs Group. But the global elite don’t just control these mega-corporations. According to Hudes, they also dominate the unelected, unaccountable organizations that control the finances of virtually every nation on the face of the planet.  The World Bank, the IMF and central banks such as the Federal Reserve literally control the creation and the flow of money worldwide. At the apex of this system is the Bank for International Settlements.  It is the central bank of central banks, and posted below is a video where you can watch Hudes tell Greg Hunter of USAWatchdog.com the following. ‘We don’t have to wait for anybody to fire the Fed or Bank for International Settlements’ . . . ‘some states have already started to recognize silver and gold, the precious metals, as currency’. Most people have never even heard of the Bank for International Settlements, but it is an extremely important organization.  In a previous article, I described how this ‘central bank of the world’ is literally immune to the laws of all national governments. ‘An immensely powerful international organization that most people have never even heard of secretly controls the money supply of the entire globe.  It is called the Bank for International Settlements, and it is the central bank of central banks. It is located in Basel, Switzerland, but it also has branches in Hong Kong and Mexico City. It is essentially an unelected, unaccountable central bank of the world that has complete immunity from taxation and from national laws.  Even Wikipedia admits that ‘it is not accountable to any single national government.’  The Bank for International Settlements was used to launder money for the Nazis during World War II, but these days the main purpose of the BIS is to guide and direct the centrally-planned global financial system.  Today, 58 global central banks belong to the BIS, and it has far more power over how the U.S. economy (or any other economy for that matter) will perform over the…” Fonte/Source/Quelle: http://www.hangthebankers.com/tag/karen-hudes/feed/  
Entrevista com Karen Hudes em:  http://www.youtube.com/watch?v=RJwJENSGnhE
Website: www.kahudes.net 

[5] Vitali S, Glattfelder JB, Battiston S. The network of global corporate control. 
 PLoS One. 2011;6(10):e25995. doi: 10.1371/journal.pone.0025995. Epub 2011 Oct 26.

domingo, 6 de abril de 2014

Ascensão e queda da civilização dos combustíveis fósseis

Por José Eustáquio Diniz Alves

Artigo publicado em abril 2, 2014 no EcoDebate.

“We should leave oil before it leaves us”
(Devemos deixar o petróleo antes que ele nos deixe)
Faith Birol (Chief economist of the IEA)

Tudo que sobe cai. Esta verdade não vale apenas para a lei da gravidade, mas também para os diversos sistemas econômicos-culturais da história da humanidade. A ascensão do império de Nabucodonosor desmoronou junto com os jardins suspensos da Babilônia. Após a ascensão dos impérios Persa, Egípcio, Grego, além do império progressista de Asoka na Índia e do império guerreiro de Qin Shi Huang na China, houve um período de plenitude, mas depois de um certo tempo todas essas civilizações colapsaram. O império Otomano calapsou. O império Maia colapsou. O império Austro-Húngaro colapsou, assim como tantos outros.

O “Abismo de Sêneca” é uma teoria utilizada para descrever a tendência das civilizações entrarem em colapso depois de ter atingido o seu pico máximo. O Império Romano gastou mais de 500 anos para chegar ao seu apogeu mas desmoronou em pouquíssimo tempo. Por isto se diz que a evolução da riqueza é lenta, mas a ruína é rápida. Mais recentemente o mundo assistiu a ascensão do império Soviético durante 70 anos e seu colapso em menos de um ano. Há várias pessoas que falam também em um possível colapso americano.

Mas, para além dos colapsos específicos, o mundo pode assistir a uma transformação maior do que a apresentada nos exemplos acima. Trata-se do colapso dos 250 anos da civilização dos combustíveis fósseis (1768-2018). Antes da invenção da máquina a vapor, por James Watt, em 1768, eram utilizadas três fontes básicas de energia: a força humana, a força animal e a energia da lenha (carvão vegetal obtido nas florestas). Para plantar, a humanidade usava a enxada ou o arado puxado por algum animal. A locomoção era a pé, no lombo de cavalos, camelos, etc. ou em carroças. Não existiam prédios com elevadores. A luz vinha das fogueiras ou da gordura de animais, como os óleos de baleia e tartaruga. A concentração de CO2 na atmosfera estava em torno de 280 partes por milhão (ppm).

Todavia, tudo isso mudou com o início da Revolução Industrial e Energética que aconteceu no final do século XVIII. O artesão foi substituído pela manufatura que, por sua vez, foi substituída pela grande indústria. O transporte foi revolucionado, primeiro pelas ferrovias e pelos navios a vapor, depois pelo automóvel, caminhão e rodovias, transatlânticos (e transpacíficos), aviões, helicópteros, etc. A pequena agricultura foi substituída pela grande produção agrícola na base de fertilizantes, agrotóxicos, tratores, colhedeiras, etc. As cidades que abrigavam 5% da população mundial em 1800 passaram a abrigar 50% em 2008 e devem chegar a 70% em 2050. A mortalidade infantil caiu e a esperança de vida ao nascer da população mundial chegou a 70 anos, em 2013. Tudo isto foi possível graças ao uso da energia advinda do carvão mineral, petróleo e gás.

Os ganhos foram extraordinários. Considerando o período 1768 a 2018 (auge da utilização dos combustíveis fósseis), a população mundial saltou de cerca de 760 milhões para 7,6 bilhões de habitantes (multiplicando por 10 vezes em 250 anos) enquanto a economia deve apresentar um crescimento de 130 vezes no mesmo período (números interpolados dos cálculos de Angus Maddison). Assim, o pulo do gato na história do homo sapiens foi o uso da energia extrasomática (exterior ao corpo humano ou animal). A exploração dos combustíveis fósseis tornou possível à humanidade libertar, para uso próprio e em curto intervalo de tempo, vastas quantidades de energia acumuladas durante milhões de anos na forma de hidrocarbonetos. A humanidade deixou de temer a natureza e passou a controlá-la e dominá-la. Entramos na Era do Antropoceno, que é a época em que a humanidade se torna capaz de mudar o curso natural da vida no Planeta, sendo determinante para a extinção em massa de inúmeras espécies e pelo aquecimento global e as mudanças climáticas.

Como calculou Price (1995), o uso dos combustíveis fósseis é equivalente à posse de 50 escravos por pessoa no mundo. Sociedades altamente intensivas no uso do petróleo, como os Estados Unidos (EUA), teriam o equivalente a 200 escravos per capita. Ou seja, seria com se os EUA tivessem 62 bilhões de “escravos fantasmas” à disposição do país, sendo que estes escravos não fazem greve, nem revoltas e não precisam de comida, ao contrário, ajudam a alimentar o “senhorio” humano.

Desta forma, pode-se dizer que o “santo” que propiciou o “milagre” do crescimento da civilização humana nos últimos 250 anos foi, sem dúvida, o combustível fóssil. É claro que a ciência e a tecnologia ajudaram o crescimento econômico, o aumento da produtividade e a disponibilidade de alimentos. O crescimento demográfico também foi fundamental para aumentar o número de trabalhadores e de consumidores. Mas sem energia abundante não haveria oferta de meios de subsistência e nenhuma invenção científica e tecnológica funcionaria. Desta forma, não é possível ignorar que oitenta por cento da matriz energética mundial advém do petróleo, gás e carvão mineral. Porém, este “escravo barato e cheio de energia” não é eterno e nem ilimitado. O “ouro negro” está ficando caro e cada vez mais escasso. Os problemas ambientais se avolumam e a demanda de energia aumenta com o crescimento das atividades antrópicas.

O petróleo e demais combustíveis fósseis não vão acabar totalmente e de repente, mas a exploração de novas reservas vai ficar economicamente muito cara, tornando-as inviáveis comercialmente. Um campo de petróleo é uma jazida onde o petróleo ocupa o espaço poroso entre os grãos da rocha reservatório. A jazida é uma armadilha (no Brasil, costuma-se dizer “trapa”, de trap, em inglês) que retém o petróleo no seu caminho ascendente a partir da rocha geradora. Mas a jazida é diferente de reserva, pois nem todo o petróleo de um campo pode ser extraído. Reserva de petróleo é o volume que se pode extrair, comercialmente, de uma jazida, pelos métodos de recuperação e produção conhecidos, sob as condições econômicas e regulamentares vigentes. Além disto há custos crescentes no transporte, no armazenamento, no refino, etc.

Na primeira metade do século XX, a EROEI (energia retornada sobre energia investida) era alta. Atualmente existe uma erosão da EROEI e muitos poços se tornam deseconômicos. Isto quer dizer que o limite máximo (pico) para a produção de petróleo pode ocorrer muito antes do esgotamento das jazidas, talvez a partir de 2018. Por exemplo, o Estado da Califórnia era o maior produtor dos Estados Unidos há 100 anos. Mas os campos foram se esgotando e agora a Califórnia está em terceiro lugar. A possibilidade de produzir gás de xisto (hydraulic fracturing and horizontal drilling) está esbarrando na falta de água e nos perigos de contaminação dos lençóis freáticos. Entre o gás e a água parece que a Califórnia vai ter que optar pela água e buscar uma saída da dependência dos combustíveis fósseis. O fato é que a produção de petróleo convencional está estagnada.

O pico de Hubbert (Hubbert’s peak) é uma teoria que modela a produção de petróleo indicando que as descobertas e a produção seguem, de início, a forma de uma curva logística – apresentando um crescimento lento no começo, se acelerando em um estágio posterior e depois se desacelerando até se inverter e fazer o movimento logístico para baixo. Ou seja, a produção de petróleo segue o comportamento de uma curva normal, ou em forma de sino (curva de Gauss). A teoria foi desenvolvida pelo geofísico americano M. King Hubbert, que em 1956, publicou um artigo mostrando que o pico (máximo da produção) de petróleo, no mundo, deveria ser atingido em torno de 50 anos. Depois deste pico, a produção cairia rapidamente, podendo criar um grande desequilíbrio entre a demanda e a oferta, o que provocaria um grande aumento do preço dos combustíveis fósseis.

De fato, a produção convencional de petróleo cru atingiu seu pico em algo como 75 milhões de barris dia, por volta do ano 2005, exatamente 50 anos depois das previsões de Hubbert. O que tem crescido nos últimos anos é a extração do petróleo não convencional, como o gás de xisto, as areias betuminosas e o petróleo das profundezas abissais do pré-sal. Assim mesmo, estas fontes não convencionais estão se mostrando incapazes de compensar o declínio da produção convencional. A depleção dos hidrocarbonetos parece inevitável.

Diversos estudiosos e especialistas do tema, como Gail Tverberg, estão prevendo que o Pico do Petróleo (e dos combustíveis fósseis) será atingido entre 2015 e 2020. A partir daí haverá um declínio rápido, o que poderá provocar um grande aumento do preço dos combustíveis e uma crise econômica maior do que a “estagnação secular” e de tudo que já se viu antes.

Sem energia barata e abundante, ou seja, sem os tais “escravos baratos e cheios de energia” o mundo deve passar por uma grande crise econômica e social. O PIB deve cair e o desemprego deve aumentar. Pode ser o fim do desenvolvimento como se conhece. Diversos países já passam por esta situação como os PIIGS (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha) e diversos outros passam por crises econômicas, políticas e sociais: Tailândia, Ucrânia, Síria, Egito, Argentina, Venezuela, Turquia, etc. Para agravar a situação, o preço dos alimentos vai subir, pois grande parte da agricultura mundial é “petroficada” e não funciona sem os fertilizantes, agrotóxicos e o transporte, tudo dependente dos combustíveis fósseis.

O pico do petróleo está associado ao aumento do desemprego e do preço dos alimentos. Segundo Relatório do NECSI (New England Complex Systems Institute) publicado em 2012, há uma correlação importante entre o aumento do preço dos alimentos, calculados pela FAO (agência da ONU para a agricultura) e a ocorrência de protestos em todo o mundo. Sempre que o índice da FAO sobe, ocorrem mais manifestações. Crise econômica e crise ambiental, numa situação de enorme desigualdade social, pode ser um fator novo como nunca se viu nos últimos 200 anos. Pode crescer as revoltas populares e não é improvável imaginar uma situação de “canibalismo social”, desafiando as regras da civilização piramidal hierárquica.

Assim, o sonho do progresso civilizatório dos cornucopianos pode se transformar em colapso e no pesadelo do fim da civilização dos combustíveis fósseis e do consumo ostentatório. Esta situação atinge os regimes capitalista e socialista, ou seja, o modelo de sociedade urbana-industrial, independentemente de quem são os proprietários dos meios de produção. Poderá ser o fim do desenvolvimento econômico, em suas formas liberal ou estatal.

A entropia, ou degradação de energia, já havia sido prevista pelo economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen, que nos anos de 1970, mostrou que a economia não pode ignorar a 2ª Lei da Termodinâmica. Uma mesma fonte de energia não pode ser queimada duas vezes, muito menos ad infinitum. Antes do crescimento da civilização do Homo Sapiens, ocorria a retenção da energia mais rapidamente do que a sua dissipação. Atualmente, a sinergia está sendo substituída pela entropia. Georgescu-Roegen mostrou que, em algum momento, a escala da economia teria que ser reduzida, tanto em termos de capital, quanto de força de trabalho. Ou seja, ele mostrou que a alternativa para o declínio da civilização e a possível catástrofe econômica e ambiental seria o decrescimento das atividades antrópicas, quanto mais cedo melhor.

Mas parece que a humanidade ainda não acordou do sonho de grandeza e, provavelmente, terá que pagar um alto preço por ignorar uma verdade muito simples: que não pode haver crescimento infinito em um planeta finito, com recursos naturais escassos e com declínio da exergia (energia disponível). O ajuste entre o consumo humano e a biocapacidade do Planeta deve ocorrer, mais cedo ou mais tarde, e quem se preparar melhor poderá sofrer menos com o fim da civilização dos combustíveis fósseis.

Referências:

Gail Tverberg – A Forecast of Our Energy Future; Why Common Solutions Don’t Work, 29/01/2014
http://ourfiniteworld.com/2014/01/29/a-forecast-of-our-energy-future-why-common-solutions-dont-work/

BIROL, Faith. We can’t cling to crude: we should leave oil before it leaves us. Independent, 02/03/2008

David Price. Energy and Human Evolution, Population and Environment: A Journal of Interdisciplinary Studies, Volume 16, Number 4, March 1995, pp. 301-19

Nicholas Georgescu-Roegen, O decrescimento: Entropia – Ecologia – Economia. Editora Senac, SP, 2013.

Dave Lindorff. Growth is the Enemy of Humankind. 17/01/2013
http://www.nationofchange.org/growth-enemy-humankind-1358432599

Why The American Empire Was Destined To Collapse, Nomi Prins Interviews Morris Berman, March 9, 2012
http://peakoil.com/publicpolicy/why-the-american-empire-was-destined-to-collapse-nomi-prins-interviews-morris-berman

Dmitry Orlov: US empire will fall due to lack of faith, January 28, 2011
http://peakoil.com/publicpolicy/dmitry-orlov-us-empire-will-fall-due-to-lack-of-faith

ALVES, JDE. Estagnação secular, fim dos emergentes e armadilha da renda média, EcoDebate, RJ, 17/01/2014
http://www.ecodebate.com.br/2014/01/17/estagnacao-secular-fim-dos-emergentes-e-armadilha-da-renda-media-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. Bolha de Carbono: crise ambiental ou crise financeira? EcoDebate, RJ, 05/02/2014
http://www.ecodebate.com.br/2014/02/05/bolha-de-carbono-crise-ambiental-ou-crise-financeira-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

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http://www.wachstumsforum.ch/economics/e/perfect-storm.pdf

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http://stormglass101.wordpress.com/2014/03/22/peakoil-end-of-story/

Nafeez Ahmed. Ex govt adviser: global market shock from “oil crash” could hit in 2015. The Guardian, 28/03/14
http://www.theguardian.com/environment/earth-insight/2014/mar/28/global-market-shock-oil-crash-2015-peak?

Westexas. Has Global Crude Oil (Not C+C) Production Peaked? 28 Mar 2014
http://peakoil.com/forums/has-global-crude-oil-not-c-c-production-peaked-t69442.html#p1187598

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, Doutor em demografia e professor titular do mestrado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Carmagedom e a imobilidade urbana

Por José Eustáquio Diniz Alves

Publicado em março 14, 2014 em: 
http://www.ecodebate.com.br/2014/03/14/carmagedom-e-a-imobilidade-urbana-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

Armagedon é um termo bíblico para indicar uma batalha final, algo como o fim do mundo. Em termos contemporâneos o Armagedom tem sido associado às possibilidades de catástrofe, como uma guerra nuclear e outros eventos de extrema gravidade.

Exatamente porque o termo é carregado de dramaticidade que foi cunhada a expressão “Carmagedom”, significando que o excesso de carros conjugado com a falta de infraestrutura viária está provocando uma batalha final contra a mobilidade urbana. A vida nas cidades, com seus congestionamentos crescentes e as dificuldades de deslocamento, está se tornando um inferno.

A Revista Estudos Avançados, da USP (Estud. av. vol.27 no. 79 São Paulo, 2013) publicou vários artigos sobre a questão da mobilidade urbana e o direito à cidade. O artigo do urbanista Jorge Wilheim (que morreu no dia 14/02/2014, aos 85 anos, depois de ter sofrido um acidente de carro em dezembro passado), mostra que na Grande São Paulo ocorrem 35 milhões de deslocamentos, sendo 23,51 milhões somente na capital. Segundo o autor, “o grave congestionamento de todos os acessos urbanos a rodovias permite antever, em curtíssimo prazo, uma situação caótica de paralisação diária do trânsito à entrada e saída da cidade”.

Segundo o Ipea, o Brasil possui 50,2 milhões de automóveis, 19,9 milhões de motos, 7,9 milhões de outros veículos motorizados. Em São Paulo, eram 40 veículos para 100 pessoas, onde a velocidade média dos automóveis e ônibus é de apenas 22 quilômetros por hora, com congestionamentos de 120 quilômetros. As carroças andavam mais rápido na antiga Vila de Piratininga. Dados do Detran de São Paulo mostram que 130 mil novos automóveis foram registrados na cidade em 2013, o maior crescimento da frota em três anos. Com isso, a capital fechou o ano com 5,4 milhões de carros. A cidade tem hoje 11,8 milhões de habitantes – o que significa uma média de um carro a cada duas pessoas.

Muito carro e pouca infraestrutura significa vários tipos de problemas. As taxas de acidentes com veículos no Brasil (22,5 mortes por 100 mil pessoas) são mais altas que na Índia (18,9), na China (20,5) e o dobro dos Estados Unidos (11,4). As perdas no trânsito em São Paulo chegam a R$ 40 bilhões por ano; cada cidadão deixa de ganhar ou aplicar R$ 3,6 mil enquanto preso em congestionamentos. O setor de transporte é o segundo maior emissor de poluentes (7% a 9%); 68% dessas emissões se devem ao transporte individual, 32% ao coletivo. Mas só 3,8% dos 5.565 municípios têm planejamento para a mobilidade urbana, que a legislação exige – embora recursos federais de R$ 90 bilhões tenham ido para o setor no ano de 2009.

O jornalista Washington Novaes comenta a situação do caos urbano: “Quem convencerá o poder público a mudar esse quadro, principalmente em vésperas de eleição? Mas os números e argumentos estão aí. E não há como contestá-los. Podem levar os não beneficiários dos privilégios a também mudar o quadro eleitoral. Ou ocupar as ruas de novo”.

O problema é que o poder público é o principal culpado da situação. Os governos petistas (Lula e Dilma) adotaram diversas medidas para ampliar o acesso ao veículo particular, com o argumento da democratização da posse do automóvel e a ampliação do consumo da classe média. Mas em vez de investir em infraestrutura viária, o governo fez desonerações fiscais e ficou sem dinheiro para viabilizar a liberação do tráfico. Além disto o governo tem evitado o reajuste da gasolina, provocando um aumento do consumo, déficits crescentes na balança comercial e sérios problemas no orçamento da Petrobras.

Como disse o economista francês François Chesnais, em entrevista ao IHU (06/03/2014): “A indústria automobilística foi escolhida como o motor do crescimento doméstico e mantida neste papel apesar da visível perda do seu poder e dos problemas sistêmicos urbanos de grande magnitude nas cidades”. O governo abriu mão de quase R$ 12 bi do imposto da gasolina, cujo objetivo era investir em infraestrutura de transportes. O país deixou de arrecadar também outros R$ 11 bilhões com a redução da tributação sobre o automóvel. Somando tudo, foram quase R$ 23 bi que o país gastou em subsídios para a classe média ficar presa nos congestionamentos.

Também os empresários reclamam da dificuldade de circulação de cargas urbanas que inviabiliza o sistema just-in-time, que poderia proporcionar ganhos no processo produtivo através da redução de estoques e da diminuição no tamanho dos lotes, mas requer uma maior frequência de entregas e, portanto, um maior número de viagens automotivas. Assim, o aumento da participação de veículos de carga cria novos conflitos, além da disputa por vagas em estacionamento e espaço nas vias, entre veículos particulares, ônibus, motos, vans e caminhões de diversas capacidades de carga.

Mas a imobilidade urbana prejudica toda a população. Os dados do censo demográfico 2010, do IBGE, mostram que, entre as pessoas com alguma ocupação, 31,03% dos residentes na capital paulista e 25,3% dos fluminenses, demoram mais de uma hora no transporte para o trabalho. Ou seja, são pessoas que gastam mais de duas horas por dia para se locomover da casa para o emprego e do emprego para casa.

Estas mais de duas horas desperdiçadas no trânsito diariamente, não são apenas jogadas fora, mas representam um estresse muito grande para as pessoas, com reflexo negativo na dinâmica das empresas, das famílias e dos indivíduos. Duas horas perdidas por dia multiplicado por milhões de pessoas são um montante imenso de tempo que poderia ser usado para aumentar a produção econômica, a educação, a saúde ou mesmo o lazer e o descanso.

O Brasil é apenas um pequeno exemplo da civilização do automóvel e dos combustíveis fósseis que ocupa as ruas e lançam CO2 na atmosfera, acelerando o aquecimento global. O mundo já tem mais de 1 bilhão de veículos e pode chegar a 2 bilhões até 2030, segundo SPERLING e GORDON (2009). Mas reportagem da Bloomberg (24/02/2014) mostra que o mundo pode deixar de produzir tantos veículos como previsto, pois está se chegando ao “Pico do Carro” (‘Peak Car’) na era do Pico do Petróleo.

A perda de mobilidade urbana, o custo excessivo do transporte público e privado, a má qualidade dos serviços de transporte, a poluição, as mortes e acidentes e o desperdício de tempo nos deslocamentos representam um retrocesso na qualidade de vida e podem comprometer o bem-estar geral das pessoas. O direito à cidade está se transformando em um “carmagedon” que engarrafa e mata a mobilidade, inviabilizando o pleno desfrute dos espaços públicos urbanos.

Referências:

Jorge Wilheim. Mobilidade urbana: um desafio paulistano. Revista Estud. av. vol.27, no.79, São Paulo, 2013  http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142013000300002

Washington Novaes. Panorama dos privilégios no setor dos transportes, EcoDebate, RJ, 27/01/2014
http://www.ecodebate.com.br/2014/01/27/panorama-dos-privilegios-no-setor-dos-transportes-artigo-de-washington-novaes/

SPERLING, Daniel, GORDON, Deborah Two Billion Cars: Driving Toward Sustainability. Oxford, NYC, 2009  http://www.amazon.com/Two-Billion-Cars-Driving-Sustainability/dp/B0071UPDOA

Jeff Green and Keith Naughton. Woes of Megacity Driving Signal Dawn of ‘Peak Car’ Era, 24/02/2014
http://www.bloomberg.com/news/2014-02-24/woes-of-megacity-driving-signals-dawn-of-peak-car-era.html

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail:jed_alves@yahoo.com.br

Presidente do Cimi denuncia ao papa Francisco violações aos direitos indígenas

05 / 04 / 2014
O papa Francisco e o presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), dom Erwin Kräutler, se reuniram nesta sexta-feira (4), no Vaticano, para discutir as violações aos direitos indígenas no Brasil. Segundo a assessoria do Cimi, os representantes da entidade indigenista ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) relataram ao líder mundial da Igreja Católica casos de violência contra as comunidades indígenas – em especial a situação dos povos guaranis e guarani-kaiowás de Mato Grosso do Sul, que vivem em áreas consideradas insuficientes para suas necessidades.

Em nota, a assessoria do Cimi informa que dom Erwin entregou ao papa um documento no qual a entidade indigenista denuncia, entre outras coisas, que as agressões contra os índios são promovidas por grupos privados, em aliança com o governo federal. “Grupos políticos e econômicos relacionados com a agroindústria, a mineração e construtoras, com apoio e participação do governo brasileiro, tratam de revogar os direitos territoriais dos povos indígenas”, diz trecho do comunicado.

De acordo com o Cimi, ao menos 437 terras pertencentes a 204 comunidades indígenas sofrem com os impactos de grandes empreendimentos. Caso da construção de usinas hidrelétricas como a de Belo Monte, no Pará. A entidade indigenista afirma, ainda, que entre os povos afetados por tais projetos estão grupos em situação de isolamento voluntário.

O documento também trata dos conflitos resultantes da disputa por terras entre índios e produtores rurais, no sul da Bahia e no interior do Rio Grande do Sul, e menciona a situação dos povos indígenas do Vale do Javari – sudeste do estado do Amazonas — que, de acordo com o Cimi, não recebem a devida assistência médica e sucumbem a surtos de hepatite e de outras doenças contagiosas.

Ainda de acordo com a assessoria, dom Erwin e o assessor teológico do Cimi, Paulo Suess, afirmaram ao papa Francisco que o governo da presidenta Dilma Rousseff, contrariando a Constituição brasileira, paralisou a demarcação das terras indígenas, o que serviria de estímulo à violência contra os direitos dos povos tradicionais. De acordo com o Artigo 67 do texto constitucional de 1988, a União deveria concluir a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos, a partir da promulgação da Carta Magna.

“A paralisação da demarcação é uma das principais causas de conflito e da violência que sofrem os povos indígenas”, diz outro trecho do documento entregue ao papa, junto com cópias de publicações e estudos que sustentam as denúncias apresentadas ao Vaticano.

Dom Erwin relatou ao papa que o próprio Cimi e outras organizações indigenistas são alvo de ataques para garantir os interesses do agronegócio, e que a violência física e verbal contra os representantes dessas entidades tem aumentado. “Os missionários do Cimi são atacados sistematicamente por deputados que encarnam os interesses da agroindústria e dos fazendeiros”. (Fonte: Agência Brasil)