Por Sergio U. Dani, de Heidelberg, Alemanha, em 11 de dezembro de 2012.
Dois números da revista alemã ‘Der Spiegel’ publicados este ano espelham uma mudança de posição da Alemanha entre duas épocas conturbadas da história mundial: do ataque via atuação direta nos fronts da segunda guerra mundial, à defesa no módulo ‘teleguiado’, através do fornecimento de armas para aliados na época atual.
As duas capas do ‘Der Spiegel’ apresentam o general favorito de Hitler, Erwin Rommel como ‘o general do diabo’ (1) e a chanceler Angela Merkel como uma espécie de corretora de armas (2). O número mais recente da revista apresenta Merkel em uniforme camuflado, cercada por armas de guerra que são exportadas para regiões em crise no mundo. Os principais tópicos abordados pelos jornalistas que assinam a matéria da capa incluem um relatório sobre as reuniões secretas do Conselho Federal de Segurança Alemão onde são tomadas as decisões sobre a venda de armamentos para governos como os da Algéria, Egito, Arábia Saudita e Israel.
Os jornalistas dedicaram atenção especial aos governos repressores da primavera árabe. Ao fornecer milhares de armas pesadas, a Alemanha estaria dando a estes governos autocráticos violadores dos direitos humanos os meios e a licença para matar. O governo alemão lança mão de bilhões de euros em recursos do contribuinte – as chamadas ‘Hermes-Bürgschaften’ – para financiar a indústria armamentista alemã e dar garantias de crédito às exportações das armas.
A ‘doutrina Merkel’, interpretada pelos jornalistas como a ‘licença para matar’ é apresentada nas palavras da própria primeira-ministra: ‘É do nosso interesse, disso estou convencida, habilitar nossos parceiros para atuarem de modo eficaz no sentido da manutenção ou restauração da segurança e paz nas suas regiões’.
A ‘doutrina Merkel’ representa uma quebra do consenso na política externa alemã. Heidemarie Wieczorek-Zeul, do partido SPD acredita que a Alemanha deve contribuir para evitar uma nova corrida armamentista. ‘Isto é uma questão de credibilidade da política externa alemã’, afirmou. O ex-chanceler Helmut Schmidt, mestre da política externa alemã também posiciona-se contrário à venda de armas para regimes autocráticos como os sauditas, que podem usar os meios fornecidos pela Alemanha para esmagar a sua própria população nos casos frequentes das revoltas populares contra esses regimes totalitários e violadores dos direitos humanos. Mas, Schmidt não é contrário ao fornecimento de armas para governos aliados.
No seu relatório sobre a exportação de armas de 2010, a GKKE (Conferência Conjunta Igreja e Desenvolvimento) alertava sobre o desrespeito aos direitos humanos pelos governos da Arábia Saudita, Angola, Brasil, Nigéria, Pakistão, Rússia e Turquia. A GKKE posicionou-se de forma clara: ‘A transferência dos meios para a violência deve ser avaliada, em princípio, pelos mesmos critérios da ameaça ou uso da violência.’
A estratégia do ‘Blitzkrieg’ cedeu lugar à ‘doutrina Merkel’, o masculino flexionou para o feminino, como se fosse uma adaptação à nova realidade da Alemanha e do mundo. A tecnologia e a ética de ataque e defesa teleguiados são as novas tendências da moderna indústria armamentista e dos governos. Apenas o efeito continua sendo o mesmo: a matança dos mais pobres.
Referências/créditos:
(1) Mythos Erwin Rommel. / Der Teufels Feldmarschall. / Hitlers Helfer, Hitlers Opfer. Der Spiegel 44/2012.
(2) Merkels geheime Rüstungs-Deals / Deutsche Waffen für die Welt. Der Spiegel 49/2012.
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