http://www.contraosagrotoxicos.org/index.php/inicio/271-gerente-geral-de-toxicologia-da-anvisa-e-exonerado-por-denunciar-corrupcao
O gerente-geral de toxicologia da ANVISA, Luís Cláudio Meirelles, foi exonerado do cargo nesta quarta-feira (14).
Segundo carta divulgada pelo pesquisador que trabalhava há 12 anos na ANVISA, o mesmo denunciou irregularidades graves na liberação de agrotóxicos.
"As graves irregularidades envolveram o deferimento de produtos sem a necessária avaliação toxicológica, falsificação de minha assinatura e desaparecimento de processos em situação irregular", informou.
Ao constatar as irregularidades, Meirelles teria tomado as atitudes esperados de um funcionário público:
"Em seguida, solicitei ao Diretor-presidente o afastamento do Gerente da GAVRI, pois os problemas estavam relacionados às atividades de sua Gerência, assinalando que houve rompimento da relação de confiança exigida para o cargo. Entretanto, a medida contrariou interesses maiores dentro da instituição, e na relação com o Ibama e MAPA," avaliou o pesquisador.
"As razões para a exoneração me foram transmitidas pelo Diretor-Presidente da ANVISA. Após elogiar o trabalho, a lisura e o reconhecimento externo que conferi à GGTOX, ele me informou que, na sua visão, o encaminhamento das irregularidades foi confuso e inadequado, e que faltou diálogo prévio (..). Afirmou, ainda, que o processo de afastamento do gerente da GAVRI não fora apropriado, e que a indagação do Ministério Público sobre esse fato, que antecedeu às investigações internas, não deveria ter ocorrido", esclareceu.
Segundo informações, os agrotóxicos liberados com assinatura falsa de Meirelles seriam utilizados para ferrugem da soja, ou seja, estão ligados aos grandes interesses do agronegócio brasileiro. Ele ainda detalha na carta as pressões que a ANVISA tem sofrido para liberar cada vez mais agrotóxicos, sem a devida preocupação com a saúde da população.
Confira a integra da carta de Luís Cláudio:
"Comunico que, no dia 14 de novembro de 2012, deixei o cargo de Gerente Geral de Toxicologia da ANVISA, após ter trabalhado por 12 anos e 9 meses na agência, cedido pela Fundação Oswaldo Cruz-FIOCRUZ, para onde retorno.
Durante estes anos, tive a oportunidade de interagir com muitos colegas e amigos, que muito me ensinaram. Levo da ANVISA riquíssima bagagem sobre a importância da prevenção e controle que a Vigilância Sanitária desenvolve para produzir saúde e bem-estar para a população.
Agradeço sinceramente a todos que colaboraram com a minha gestão e, ao final deste texto, segue meu novo endereço profissional na FIOCRUZ, Rio de Janeiro, onde estarei à disposição para o desenvolvimento de trabalhos de interesse público na área da saúde.
Em seguida apresento informações sobre a minha saída da ANVISA e destaco algumas questões preocupantes sobre o contexto atual, que poderão afetar a atuação do setor Saúde no controle de agrotóxicos do Brasil.
Sobre os fatos:
No início do mês de agosto, identificamos irregularidades na concessão dos Informes de Avaliação Toxicológica de produtos formulados, que autorizam o Ministério da Agricultura a registrar os agrotóxicos no país. Frente aos primeiros fatos, solicitei aos gerentes que levantassem as informações para a imediata adoção de providências. Os levantamentos foram realizados e contaram com a colaboração dos responsáveis pela Gerência de Análise Toxicológica – GEATO e da Gerência de Normatização e Avaliação – GENAV. A Gerência de Avaliação do Risco – GAVRI não colaborou com qualquer informação.
As graves irregularidades envolveram o deferimento de produtos sem a necessária avaliação toxicológica, falsificação de minha assinatura e desaparecimento de processos em situação irregular.
Primeiramente identificamos irregularidade em um produto, posteriormente em mais cinco, e recentemente em mais um, com problemas de mesma natureza. Para cada um deles foi instruído um dossiê com a identificação da irregularidade e a anexação de todas as provas que mostram que o Informe de Avaliação Toxicológica foi submetido para liberação sem a devida análise toxicológica.
Por ocasião da primeira irregularidade observada, comuniquei de imediato os fatos ao Chefe da Coordenação de Segurança Institucional – CSEGI, que também é Diretor-adjunto do Diretor-Presidente, e ao Diretor da Diretoria de Monitoramento – DIMON. Informei a ambos que estava enviando os processos à CSEGI para adoção de providências e cancelando os documentos de deferimento. Não recebi qualquer orientação adicional ao que propus.
Em seguida, solicitei ao Diretor-presidente o afastamento do Gerente da GAVRI, pois os problemas estavam relacionados às atividades de sua Gerência, assinalando que houve rompimento da relação de confiança exigida para o cargo.
Todos os procedimentos e medidas foram previamente apresentados às instâncias superiores da ANVISA, na busca de auxílio e orientação. As medidas que me cabiam, enquanto gestor da área, foram adotadas para garantir a segurança dos servidores, dos documentos e dos sistemas acessados pelos técnicos da GGTOX, bem como a imprescindível visibilidade institucional.
Sobre as medidas adotadas
Para todos os produtos que apresentaram suspeita de irregularidade na avaliação toxicológica, emiti ofícios às empresas, suspendendo o Informe de Avaliação Toxicológica concedido pela GGTOX/ANVISA, bem como determinando, em alguns casos, que se abstivessem de comercializar o produto até que as irregularidades fossem apuradas e sanadas. Também encaminhei os ofícios ao Ministério da Agricultura, com cópia para o IBAMA, notificando as decisões e solicitando as medidas adequadas.
Solicitei à Gerência Geral de Tecnologia da Informação-GGTIN, cópia do backup de todos os documentos da pasta da GGTOX que ficam no servidor da ANVISA. A cópia está disponível na GGTIN e para o Gerente Geral de Toxicologia, no modo leitura.
Encaminhei à CSEGI o relato de todas as medidas adotadas, a descrição detalhada dos fatos e os documentos juntados, para a adoção das providências cabíveis. Informei ainda, em todos os memorandos, que seguíamos na busca de outras possíveis irregularidades, o que poderia resultar no envio de novos processos àquela Coordenação.
Por último, comuniquei os fatos e providências ao conjunto dos servidores, e discutimos a natureza grave do problema. Enfatizei, ainda, a importância de garantir o prestígio da GGTOX-ANVISA e de quem nela trabalha, afastando as estratégias destrutivas que buscam desqualificar a ação reguladora das instituições públicas em episódios com este.
Sobre a exoneração:
As razões para a exoneração me foram transmitidas pelo Diretor-Presidente da ANVISA. Após elogiar o trabalho, a lisura e o reconhecimento externo que conferi à GGTOX, ele me informou que, na sua visão, o encaminhamento das irregularidades foi confuso e inadequado, e que faltou diálogo prévio, o que gerou dificuldades na relação de confiança entre minha pessoa e a Diretoria. Afirmou, ainda, que o processo de afastamento do gerente da GAVRI não fora apropriado, e que a indagação do Ministério Público sobre esse fato, que antecedeu às investigações internas, não deveria ter ocorrido.
Em resposta, discordei dos argumentos apresentados, pois, como dito por ele, não havia críticas à minha gestão, e a solicitação de investigação das irregularidades era de minha obrigação enquanto gestor e servidor público. Também destaquei que respeitei a hierarquia e os encaminhamentos formais.
Disse ainda que sempre estive à disposição da Diretoria para informá-la dos fatos, e busquei diálogo e orientação junto à CSEGI e à DIMON. Lembrei que, durante o episódio, as gerentes da GEATO e da GENAV não foram chamadas sequer uma vez para informar ou confrontar alguma afirmação que por ventura não tivesse sido clara o suficiente para suscitar uma rápida tomada de providências.
Também esclareci ao Diretor-Presidente que as manifestações externas sobre a minha exoneração não deveriam ser interpretadas como pressão para me manter nesse cargo, pois eu tampouco desejava continuar a trabalhar sob sua direção. No entanto, zelaria para que a apuração das irregularidades fosse levada até a última instância.
Sobre o futuro
Frente ao exposto, considero importante compreender que o episódio das irregularidades deve ser tratado com a firmeza necessária, sem que isto venha denegrir a qualidade do trabalho realizado pela Gerência de Toxicologia ou ocultar a tentativa de desregulamentação do controle dos agrotóxicos no Brasil.
Nesse contexto, destaco alguns fatos que vêm ocorrendo e cujo objetivo é o de retirar competências da Saúde ou “flexibilizar” sua atuação. Eles têm sido debatidos e repudiados pela Gerência, pelo retrocesso que representam para a sociedade:
- O Projeto de Lei - PL n˚ 6299/2002, ao qual foram apensados outros PLs (PL 3125/2000, PL 5852/2001, PL 5884/2005, PL 6189/2005, PL 2495/2000, PL 1567/2011; PL 4166/2012; PL 1779/2011, PL 3063/2011 e PL 1567/2011), que estão tramitando na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal, e que retiram competências da ANVISA e do IBAMA nas avaliações de agrotóxicos.
- A criação de uma “Agência nacional de Agroquímicos”, veiculada pela mídia, e cujo conteúdo informa que um dos fatores impeditivos da implementação da nova Agência seria a “resistência dos técnicos da ANVISA”(sic).
- As tentativas de desqualificação da Consulta Pública 02, de 2011, oriunda da revisão da Portaria 03, de 1992, e que estabelece critérios cientificamente atualizados para a avaliação e classificação toxicológica de agrotóxicos. Durante o período da consulta pública, o setor regulado chegou a propor que esta revisão fosse suspensa.
- As tentativas permanentes de impedimento da reavaliação de agrotóxicos ou de reversão das decisões já adotadas, através das constantes pressões políticas e demandas judiciais. Tais procedimentos tem sufocado o trabalho da Gerência. Oito produtos ainda estão pendentes de conclusão; a proibição do metamidofós foi emblemática, pelo tanto que onerou as atividades da equipe.
- As tentativas de flexibilização da legislação, com o intuito de permitir a criação de normas que autorizem as alterações de composição e o reprocessamento de produtos, sem critérios técnicos fundamentados.
Abraços.
Luiz Cláudio Meirelles
Pesquisador em Saúde Pública
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana – CESTEH
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca – ENSP
Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ
Rua Leopoldo Bulhões, 1480, Manguinhos.
CEP 21041-210 Rio de Janeiro, RJ."
Enviado por Débora Calheiros (publicação autorizada pela autora):
ResponderExcluirData: Sábado, 24 de Novembro de 2012, 18:38
Prezados,
Quem trabalha com dignidade e seriedade na área socioambiental e saúde coletiva está sendo perseguido, criminalizado, judicializado e exonerado... Pune-se de forma aviltante e distorcidamente quem trabalha sério...
Onde estamos??
Estado de Direito ferido, vilipendiado... soube por colegas de lá que isso já ocorreu nos EUA na época do Bush... não sei atualmente... qdo órgãos ambientais, antes referências internacionais de qualidade e lisura (EPA, FDA), foram infiltrados deliberadamente no governo por agentes de empresas privadas, em especial grandes multinacionais do agronegócio.
Um Código Florestal sem qualquer base técnica em pontos cruciais para a conservação dos rios e suas águas, recurso natural vital para todos, votado apenas por um setor da sociedade ( e seus correligionários) de grande poder político e econômico, legislando, portanto, em causa própria, jogando-se o princípio básico de usos múltiplos de Precaução e muitos outros no lixo...
Funcionários do IBAMA, ICMBio, MMA, MDA e EMBRAPA já denunciaram censura, perda da diginidade profissional, interferencia claramente política em decisões eminentemente técnicas.... pessoas desmotivadas e muitas mesmo ficando doentes com tamanha pressão emocional e afronta à ética pessoal e profissional... tendo que se calar sob práticas autoritárias, sem qualquer qualidade técnica e sem nenhum compromisso com o espírito público e o bem comum, ou seja, práticas não só anti-éticas, como ilegais, criminosas... dada a Lei que rege a Administração Pública.
Agora também na ANA...
http://noticias.bol.uol.com.br/brasil/2012/11/24/chefe-de-gabinete-da-presidencia-em-sp-e-demitida.jhtm
Mudando irresponsavelmente leis que preservariam a saúde ambienal e coletiva...
http://www.midianews.com.br/conteudo.php?sid=5&cid=136985
CNRH e CONAMA inoperantes... ou condescendentes com o poder economico.
Senhores e senhoras, deveríamos reagir e de forma urgente!
Solicito o apoio do MPF para tal reação.
Formalizo, então, nesta mensagem uma solicitação como cidadã e cientista à Dra. Sandra Kishi, que por gentileza nos oriente como poderíamos formalmente reagir à tamanho desresepito, intromissão em assuntos técnicos que se referem à direitos difusos, de toda a sociedade, visando resguardar a qualidade de trabalho, os direitos profissionais e contitucionais dos funcionários que questionam e zelam pelo rigor técnico e que tem compomisso público com o povo brasileiro, bem como resguardar o Estado de Direito.
Não estamos na época da inquisição e muito menos da ditadura.
Atenciosamente,
Débora Calheiros
"Desinformar é controlar..." Marilena Chauí.
Prezada Débora,
ResponderExcluiresse incidente, como você bem mostra, não é um fato isolado. Acredito que a sociedade brasileira tem a solução para esse problema, apenas AINDA não se deu conta disso.
O povo brasileiro, assim como o norte-americano, ainda não aprendeu a agir solidariamente, agir como um tecido social.
Mas o potencial é incrívelmente alto. Veja que nós conseguimos matar mais de 50 mil por ano! Basta que os nossos sagrados justiceiros dêem-se conta dos seus verdadeiros inimigos, escolham os alvos e os métodos certos e em pouco tempo teremos resolvido o problema.
O nosso Joaquim Barbosa já mostrou que corta a cabeça da corrupção com a espada da justiça. O povo está sintonizado nele, isso é um excelente
sinal.
Os cientistas e técnicos vilipendiados precisam saber agir diante do caso sério. Basta que sigam as regrinhas da polícia, adaptadas:
1. Chame ajuda de urgência (polícia, advogado, Ministério Público);
2. Não se exponha ao perigo (agir com cautela e sangue-frio, ser um “herói-seguro”);
3. Conclame os outros a ajudar (agir em bloco, ser solidário, comprar a briga como se fosse sua);
4. Cuide das vítimas (prestar socorro, ser solidário, criar mecanismos alternativos para contornar a negligência ao cuidado com as vítimas. As vítimas da corrupção, da injustiça e da arbitrariedade são geralmente os melhores elementos da sociedade, os “biodesagradáveis”,
os portadores de futuro, e devem ser prestigiados);
5. Guarde bem as feições dos criminosos (políticos corruptos, hipócritas, falsos cientistas ou técnicos "de aluguel" dos interesses privados, parasitas do povo, etc.);
6. Sirva de testemunha (denuncie, finque o pé com determinação e persistência contra os corruptos).
A internet é um instrumento poderoso, e a comunidade brasileira no exterior é uma força
adormecida.
Vamos em frente!
Abraços,
Sergio